Luis Augusto Medeiros Rutledge
Ao mesmo tempo que as crises globais afetam as relações internacionais entre as nações e as futuras decisões de política externa, se verifica no setor privado uma nova pauta nas reuniões dos líderes do mercado mundial e CEOs de corporações internacionais. Os riscos geopolíticos e estratégicos estão pressionando fortemente a agenda dos líderes empresariais que passam a considerar absolutamente necessário o entendimento do impacto dos conflitos e da dinâmica geopolítica internacional nas empresas.
Guerra comercial entre EUA e China, a guerra infinita entre Ucrânia e Rússia e a escalada do conflito no Oriente Médio, estão impactando nas questões centrais da gestão corporativa para os líderes do mercado mundial. Hoje, as grandes corporações possuem de forma concreta mais analistas ou consultores para avaliar um campo muito maior e mais complexo de fatores de influência política, riscos e oportunidades do que no passado.
Crises políticas ou militares, disputas comerciais, conflitos de commodities ou mudanças climáticas: os desenvolvimentos geopolíticos são centrais para as atividades comerciais da maioria das empresas. As análises do cenário atual projetam aos líderes empresariais conclusões e percepções para suas decisões de orientação estratégica e investimentos de longo alcance global. Hoje, nos conselhos de grandes corporações se discutem os riscos geopolíticos que possam afetar as questões estratégicas dos órgãos de decisão. O risco geopolítico e a incerteza são hoje a maior categoria de risco percebido em curto prazo para as empresas globais.
Atualmente, relatórios mensais sobre a situação geopolítica mundial são comuns em todas as reuniões do conselho fiscal das grandes corporações internacionais. A necessidade atual nos conselhos empresariais não se resume somente aos números gerados por analistas econômicos. Hoje, diplomatas e cientistas políticos atuam como consultores analisando a influência da geopolítica na perspectiva global do comércio internacional.
Antes da pandemia, o mundo ainda funcionava em grande parte de acordo com regras pré-determinadas. No entanto, a pandemia e a guerra na Ucrânia mudaram fundamentalmente isso. As empresas perceberam alterações comerciais devido à crescente incerteza no planejamento de negócios.
A questão principal é qual a influência dos fatores geoeconômicos nos mercados de suprimentos e serviços. As empresas, principalmente europeias, estão sentindo os efeitos da atual situação geopolítica por meio de problemas na cadeia de suprimentos e preços voláteis de energia, entre outras coisas. A solução em muitos países envolve as expressões: desacoplamento, redução de risco, near-shoring e friend-shoring, ou seja, estratégia de logística em que uma empresa ou organização alavanca relacionamentos próximos, parcerias ou colaborações com outras entidades (friendshoring) e estratégia de terceirização de serviços ou produção que envolve a transferência de atividades de uma empresa para fornecedores ou parceiros localizados em países geograficamente próximos (nearshoring).
As análises geoeconômicas são fundamentalmente relevantes para a economia global devido à sua forte orientação para o setor de exportação e às dependências associadas aos mercados internacionais. As incertezas atuais tendem a reforçar a alta importância de grande parte dos membros do conselho das grandes corporações estimarem que os riscos geopolíticos para sua própria empresa sejam altos, influenciados pela incapacidade diplomática em conter os avanços armamentistas. Ao mesmo tempo, as perspectivas econômicas estão se obscurecendo.
As realidades geopolíticas alteradas exigem um repensar e a política deve ser levada em consideração como uma nova dimensão central nas decisões estratégicas. Os desenvolvimentos geopolíticos são um desafio e uma oportunidade para quase todas as empresas. Os conflitos geopolíticos mais recentes atingiram diretamente a disponibilidade e os custos de matérias-primas e energia e a interrupção das cadeias de suprimentos.
Os riscos geopolíticos levam à incerteza. Isso coloca uma pressão sobre a economia e os mercados financeiros, pois decisões importantes são adiadas. As empresas estão adiando decisões de investimento ou contratando novos funcionários. Diversos projetos do setor de energia estão segurando seus aportes de investimento no Oriente Médio pelo risco geopolítico de uma maior escalada militar que envolvam diversos países árabes.
Diferentes cenários podem significar incertezas para a economia e mercados e se torna importante a abordagem ao risco geopolítico. Analisar regularmente situações de alto risco em muito pouco tempo para tomar decisões em resposta a desenvolvimentos significativos que movimentam o mercado.
Uma contribuição importante para o planejamento de cenários são as análises de profissionais de relações internacionais e cientistas políticos. Uma variedade de cenários que incidem na política e economia global são monitorados diariamente, incluindo choques geopolíticos.
Recentemente, algumas majors (empresas de petróleo) fizeram uso de análises geopolíticas para garantir a segurança logística do petróleo em trânsito. Um cenário real é uma guerra no Oriente Médio, com os preços do petróleo subindo para US$ 150 o barril e as principais rotas marítimas sendo fechadas. O impacto macroeconômico se reflete na alta inflacionária e a retração do crescimento global, similar em alguns aspectos aos impactos energéticos após a invasão da Ucrânia.
Guerras e conflitos podem ter consequências muito negativas para países de forma isolada e até mesmo para a economia global. Em todos os casos, as grandes corporações são afetadas.
Os atuais conflitos, tarifas e sanções forçaram as empresas a reavaliar como e onde obtêm seus suprimentos. Muitos realocam a produção para seu país de origem (onshoring) ou a realocam para um aliado político (friendshoring). Desta forma, a geopolítica continuam sendo uma das principais guias dos planos financeiros das empresas globais.
A ferramenta geopolítica enfatiza a importância da política geográfica. Trata-se de fronteiras (naturais), infraestrutura, recursos, rotas comerciais seguras, meios militares de poder e outros atores que possam surgir.
Por fim, o aumento da instabilidade geopolítica tornou-se um risco real e atual no mundo corporativo. E, a incerteza impulsiona a volatilidade econômica e social, mesmo em regiões anteriormente estáveis. Hoje, sem geopolítica aplicada à análise de risco, o processo de decisão é um tiro no escuro.
Luis Augusto Medeiros Rutledge
Engenheiro de petróleo formado pela UNESA e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC.
Pesquisador da UFRJ, Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior - FUNCEX.
Colunista do site MenteMundo
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